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quarta-feira, 31 de março de 2010

Nazistas

"Quarta-feira, 19 de Setembro de 2007

NAZISTAS

kelly samara carvalho dos santos queria conquistar o mundo. para atingir este objetivo, saiu de casa aos 15 anos, em pouco tempo adotou o nome de kelly tanchesi e passou a aplicar golpes e furtos em quem quer que caísse na sua frente. uma de suas últimas vítimas foi a aposentada campos de souza, de 84 anos. a pobre senhora fez o seguinte relato à folha de são paulo: "eu caí na rua, ela me ajudou e me levou até em casa. depois voltou para ver se eu estava bem, pegava o celular e fingia que conversava com o pai, que seria dono de loja da oscar freire, pedindo que ele me desse um emprego para eu ter uma atividade. um dia, sem eu perceber, roubou meu talão de cheques".

adolph hitler, que não perdia seu tempo esperando aposentadas caírem na sua frente, foi um pouco menos ambicioso, mas também queria conquistar o mundo. e ao contrário de kelly tanchesi, ele acreditava no que dizia. conquistar o mundo para ele significava torná-lo um lugar melhor para se viver. tal qual os brasileiros, ele acreditava que os seus risonhos lindos campos tinham mais flores e que seus bosques tinham mais vida. além, é claro, de também crêr que fazia parte de um povo distinto dos demais: o povo germânico era belo, forte, impávido, colosso e, acima de tudo, gigante pela própria natureza! hitler tinha, inclusive, uma teoria para explicar a natureza dessa grandeza:

“tudo neste mundo pode tornar-se melhor. toda miséria pode tornar fecunda a energia humana e toda opressão pode suscitar as forças que produzem um renascimento moral, enquanto se conservou o puro sangue. mas a perda da pureza do sangue destrói para sempre a felicidade interior, rebaixa o homem para sempre, tendo indeléveis conseqüências corporais e morais. é no sangue, exclusivamente, que reside a força ou fraqueza do homem. os povos que renunciam a conservar a pureza de sua raça renunciam à unidade de sua alma.”

não vim aqui defender sua teoria, o seu método, nem sua técnica de trabalho. isso seria o mesmo que lutar, por exemplo, contra o tabagismo ou o uso de drogas (o nazismo assumiu muitas formas ao longo das últimas décadas). minha intenção é demonstrar que a tese de hitler não era muito diferente da tese dos primeiros austrolopithecus. quando o macaco de kubrick descobre que um pedaço de osso pode se tornar uma arma, e que se jogada aos céus ela pode subitamente se transformar numa espaço-nave, ele estava fundando aquilo que seria o alicerce de todas as sociedades humanas: a idéia de que nós, em oposição ao outro, ao distante, ao diferente, somos seres dotados de uma superioridade indiscutível. até hoje, nos dias de festa, alguns dos bons selvagens de rosseau estão fraternalmente na amazônia saboreando funcionários da funai no tucupi. por que quando pensamos em termos humanitários sempre colocamos à frente de tudo, com gloriosa satisfação, nosso orgulho grupal?

a coisa toda começa no planeta, quando nos preocupamos com o que vai ser da coca-cola quando as fontes de água potável do mundo se esgotarem; passa pelo problema dos estados nacionais - e aqui cada um quer para si a maior fatia do bolo, seja lá o que esteja ocorrendo na áfrica. e assim caminhamos em ordem descrescente até chegar no problema da suburbana que viu na tv que quando comprar roupas de estilistas famosos namorará, enfim, o fábio assunção. o que tudo isso deixa claro é que o nacionalismo e todos os seus parentes próximos são formas amplificadas de egocentrismo. mas acredito que isso todo mundo já sabe. o que ninguém sabe é que hitler nasceu na áfrica há duzentos ou trezentos mil anos e que o maior culpado pela eclosão da segunda guerra mundial foi o mickey mouse."

M.R.

Texto de Malcom Robinson. Grande amigo, escritor, músico e exilado político por conta própria.

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